Desde março deste ano, o Federal Reserve vem
realizando um aperto monetário, através da subida da Federal Funds Rate, como é conhecida a
sua taxa básica de juros, no intuito de combater a maior inflação dos últimos 40 anos, que saiu
de controle após enormes estímulos monetários e fiscais durante a pandemia e que foi ainda
mais estimulada por problemas de interrupção na cadeia de produção global devido aos seguidos
lockdowns e pela guerra entre Rússia e Ucrânia. Sabendo-se que a precificação de um
ativo financeiro pode ser estipulado pelo seu fluxo de renda futuro descontado
a taxa de juros, então, podemos deduzir que quanto maior forem os juros, menor tende
a ser o preço desses ativos no presente. Do mesmo modo, quanto maior forem os juros, menor a atratividade de ativos voláteis e que
não rendem juros como ações e criptoativos. Some-se a isso, o fato de que o excesso de crédito
fácil dos últimos anos gerou uma infinidade de empresas que dependem de liquidez abundante
no sistema financeiro para poder sobreviver, então fica fácil perceber que o aumento
dos juros tende a desacelerar o nível de atividade econômica e, ao mesmo tempo, derrubar a
cotação de ativos de risco no mercado financeiro. Não por acaso, tivemos o pior desempenho em
um primeiro semestre do mercado acionário americano nos últimos 50 anos ,
ao mesmo tempo em que a economia real já começa a dar claros sinais
de que está entrando em recessão. Historicamente, o banco central americano para de
subir juros, quando fica evidente a desaceleração da atividade econômica e quando o mercado de ações
entra em Bear Market, entretanto, dessa vez não foi isso o que aconteceu e o motivo que explica
essa divergência histórica é a alta inflação. Como é evidente, o principal motivo para a alta
da inflação dos últimos anos, a despeito da Invasão à Ucrânia e das interrupções da cadeia
produtiva global, foi a elevação do nível de consumos dos cidadãos americanos no período
pós pandemia, devido ao excesso de liquidez. Sabendo-se disso, a estratégia declarada do
Fed para combater a inflação provocada pelo alto nível de consumo, é destruir o que eles
chamam de “Wealth Effect” ou “Efeito Riqueza”, em português, através da
queda do mercado de ações. “Efeito riqueza” é uma teoria
econômica comportamental, que sugere que as pessoas gastam mais à
medida que o valor de seus ativos aumenta. A ideia é que os consumidores se sintam
financeiramente mais seguros e confiantes em relação à sua riqueza quando suas casas ou suas
carteiras de investimentos aumentam de valor. Sendo assim, eles se sentem mais ricos, mesmo que
sua renda e custos fixos sejam os mesmos de antes. Dado que ao menos 65% da população americana
possui patrimônio investido, ao reduzir o valor patrimonial dos cidadão americanos através
da queda de suas carteiras de investimento ou imóveis, o Fed faz com que esses cidadãos
se sintam menos confortáveis em consumir mais, reduzindo assim o nível da demanda agregada, o que
exercerá uma pressão deflacionária na economia. Pela primeira vez em décadas, o Fed
está vendo a economia desacelerar e o mercado financeiro desabar e mesmo
assim, segue apertando a liquidez. Em 2018, por exemplo, depois de
módicos aumentos na taxa de juros, o mercado de ações desabou ao final deste
ano, fazendo com que o mês de dezembro, que costumeiramente é um mês de alta, tivesse seu
pior desempenho desde a Grande Depressão de 1929. Não por acaso, logo após esse episódio, o Banco
Central mudou o seu viés contracionista e não realizou mais nenhum aumento da taxa
em 2019 como projetado inicialmente, muito pelo contrário como veremos
com maior detalhe mais à frente. Desse modo, então, surge a pergunta: Até onde
vai o atual aperto monetário do Federal Reserve? Como dito nos vídeos anteriores aqui do
canal, o objetivo do Federal Reserva é provocar um “soft landing” e escapar de uma
recessão, mas dado o nível de inflação atual, é praticamente impossível que o
esforço necessário para se reduzir uma inflação de tamanha proporção
não provoque uma recessão severa. Sabendo-se disso, existem algumas
ferramentas disponíveis no mercado que nos indicam com um alto grau de precisão
até onde Federal Reserve irá levar a taxa de juros e que ao mesmo tempo podem nos indicar
o quão próximos estamos de uma recessão. A primeira ferramenta é a curva de juros. Uma curva de juros nada mais é
do que a representação gráfica do desempenho dos juros de uma
economia ao longo do tempo. Como o rendimentos dos títulos públicos são
denominados como taxas de juros livres de risco, já que são remunerados pelo governo, então
os vértices da curva de juros tendem a ser representados pelo rendimento desses títulos
públicos com prazos de vencimento distintos. Para quem quiser mais detalhes sobre
como funciona a curva de juros, o vídeo 4 da série “A Mãe de Todas
as Bolhas” trata sobre o assunto. Mas, basicamente, em tempos normais, a curva de
juros possui um formato ascendente, já que títulos de curto prazo tendem a ter rendimentos menores
do que os títulos de longo prazo. Entretanto, a escalada da inflação faz com que o
banco central eleve a taxa básica de juros, o que impacta diretamente o rendimento dos
títulos de curto prazo, fazendo com que a ponta curta da curva de juros suba. Ao mesmo tempo,
o aumento da taxa de juros tende a desacelerar o crescimento econômico e desencadear uma
recessão, fazendo com que os investidores busquem refúgio nos títulos públicos de longo
prazo, fazendo com que o seus rendimentos caiam. Essa configuração de juros maiores nos
vértices da ponta curta e juros menores na ponta longa faz com que a curva de juros
possua um formato achatado ou descendente e é a esse processo de achatamento da curva
que chamamos de inversão da curva de juros. A inversão da curva de juros é um
excelente indicador de recessões, tendo antecedido às últimas 10
recessões da economia americana. Os vértices da curva de juros de 10 e 2 anos se
inverteram pela primeira vez no atual ciclo de expansão em abril deste ano e voltou a se inverter
novamente em julho, estando hoje no maior nível de inversão desde o início dos anos 2000, durante
os meses que precederam o estouro da bolha.com. Entretanto, as inversões mais confiáveis
são as inversões dos vértices de 3 meses e 10 anos e 3 meses e 30 anos. Ao
contrário da inversão de 10 e 2 anos, essas inversões nunca falharam
e uma vez que elas ocorram, estaremos na iminência de uma próxima crise,
geralmente entre 6 meses a 1 ano e meioa frente. De fato, ambas as curvas estão estão
muito próximas de uma inversão, que no mais tardar, deverão
ocorrer até o final deste ano. A segunda ferramenta é a curva
de futuros do EuroDollar. Apesar de ser o segundo maior mercado do mundo,
perdendo apenas para o mercado do Tesouro americano, a verdade é que muito provavelmente
nunca ouviu falar do sistema Eurodólar. Eurodólar refere-se a depósitos em dólares
americanos mantidos em bancos estrangeiros ou filiais no exterior de bancos americanos
e que são remunerados por uma taxa de juros conhecida como Libor, que é a taxa
de juros pela qual bancos emprestam dólares entre si no overnight do
mercado interbancário de Londres. Como esses depósitos não estão dentro das
fronteiras dos EUA, os eurodólares estão fora da jurisdição do Federal Reserve e estão
sujeitos a um nível mais baixo de regulamentação, por isso, a Libor tende sempre a ser um
pouco maior do que a Federal Funds Rate. O preço de um contrato futuro de
eurodólar reflete a taxa de juros oferecida sobre esses depósitos.
Mais especificamente, o preço do contrato futuro de Eurodólar reflete
a taxa de juros LIBOR de 3 meses. Os preços dos contratos futuros de eurodólar
são expressos usando 100 menos a taxa de juros LIBOR de 3 meses esperada no vencimento desse
título. Dessa forma, um contrato futuro de eurodólar cujo preço é $ 96,00 reflete uma taxa
de juros esperada de 4%, ou seja. 100 menos 96. Além de ser o contrato de futuros mais líquido
do mundo, de todos os instrumentos financeiros, os futuros de Eurodólar são os que melhor
refletem os fundamentos econômicos. À título de exemplo, em Setembro de 2018, o Fed
anunciou através de suas projeções 2 aumentos de juros para 2019. Nesse mesmo período, a
curva de Futuros do Eurodólar por sua vez, antecipou que o Fed estaria cortando juros no
ano seguinte e foi o que de fato aconteceu. Hoje, a curva de futuros do Eurodólar está
mostrando que os juros americanos chegarão ao seu pico dezembro de 2022 e
que o primeiro corte de juros por parte do Fed deverá acontecer
já no primeiro trimestre de 2023. Da mesma maneira, um cenário semelhante está
sendo mostrado pela nossa terceira ferramenta: os contratos futuros da Federal Funds Rate. Federal Funds Rate é nome dado à taxa
básica de juros americana que é definida pelo Fed. É por essa taxa de juros que
os bancos comerciais emprestam reservas entre si no overnight americano. De modo
semelhante ao contrato futuro de Eurodólar, os contratos futuros da Federal
Funds são expressos usando a base 100 menos a Federal Funds esperada no
vencimento desse contrato. Dessa forma, um contrato futuro de Federal Funds cujo preço é
$ 96,00 reflete uma taxa de juros esperada de 4%. De forma semelhante aos Futuros de
Eurodóllar, os Futuros da Federal Funds estão precificando um pico da taxa
de juros americana em fevereiro de 2023, seguido por um corte de juros
ainda no primeiro semestre. … A iminência de uma recessão está se
refletindo no nível de atividade econômica, o que por sua vez se reflete nas
expectativas do mercado para a inflação, como fica nítido ao observar indicadores como
a expectativa de inflação da Universidade de Michigan e o Breakeven de 5 anos,
além do impacto na expectativa do mercado sobre a atividade econômica, como
pôde ser observado durante este vídeo. Em consequência, o mercado tem se recuperado
pela expectativa de que o Fed desacelere a subida dos juros, mas esse alívio
do mercado tende a ser temporário, pois se os indicadores aqui descritos
estiverem sinalizando corretamente, estamos entre 6 meses a 1 ano e
meio de um forte revés financeiro. Se você gostou do conteúdo, então deixe
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